Quando
um filho retorna para casa, traz consigo sonhos antigos, alegrias antigas e uma
paz, o filho para casa retorna.
Neste novo drama nacional, temos Zola
(Daniel de Oliveira), um jovem que há muito tempo deixou sua cidade e viajou
pelo mundo com um grupo de circo. Anos se passaram e tornou-se numa grande
apresentação, o homem bala. Conheceu lugares, cidades e pessoas, viajou o mundo
e depois de anos, retornou a sua antiga cidade, uma ilha, esquecida pela
tecnologia, esquecida pelas grandes cidades, um local onde o tempo está como o
grande senhor.
Ao retornar trouxe consigo esta
alegria, a do filho que retorna, entretanto envolta de preocupações. Seus
familiares e amigos ficam num misto de alegria e desconfiança. Fantasmas do
passado podem retornar e com mais força. Há um drama que envolve este rapaz,
jamais ninguém comenta, mas todos sabem o que de fato acontece.
“Sangue azul” faz referência ao
poder que estava sobres os reis, dado por Deus. Somente eles podiam reinar e
governar suas terras, eles tinham sangue azul. Para manter tal pureza,
casavam-se entre membros de sua própria família. No Egito Antigo, o casamento
dava-se até entre irmãos. É sobre esta relação que o drama aborda. Sobre
irmãos, que crescem juntos e que desenvolvem entre si uma relação que vai além
de um simples elo de irmãos.
Zolah é este irmão que quando
pequeno é enviado pela mãe para ser criado por essa trupe do circo. Raquel
(Caroline Abras), sua irmã, fica na ilha, torna-se mergulhadora e se casa.
Quando os dois se encontram, há uma relação e uma tensão entre eles que se
percebe de longe, pelos olhares, pelos gestos e pela expressão facial.
Zolah tem uma relação com a
dançarina do circo, mas durante todo o drama ele mantém relações sexuais com
outras mulheres. Há uma tensão sexual em seus atos, seria isso uma forma de
escape? Uma forma de amenizar o desejo que sente pela irmã? Já Raquel, após a
chegada do irmão na ilha, se afasta cada vez mais de seu marido. Estas relações
entraram num conflito e todos da ilha serão impactados por tais atos.
Presos na ilha, todos desejam deixar
a cidade, mas Zolah insiste em permanecer. Mas o público do circo cai e
acidentes acontecem. Neste meio termo, este jovem tem que enfrentar os próprios
sentimentos do passado, sentimentos este ligado ao abandono de sua família e
tentar compreender qual foi o motivo que permitiram que ele partisse com o
circo.
“Sangue azul” caminha lentamente,
buscando seu próprio caminho. Com uma abertura moldada por uma fotografia em
preto e branco, este drama não deseja ser adorado por todos, mas mostrar uma
história ousada, com um tema delicado e difícil de ser trabalhado. Neste filme,
temas como incesto e homossexualismo são abordados com uma delicadeza
impressionante. Não há sensacionalismo em cima, mas uma abordagem singela e com
respeito.
Um ponto a se perceber neste drama,
é que ele faz uma leve referência a outro grande drama, cheio de simbologias e
metáforas, “Lavoura Arcaica”. Neste, como naquele filme, o retorno do filho que
partiu, traz consigo conflitos, tragédia e desgraça. O pior está para
acontecer, mas se em “Lavoura Arcaica” o mal acontece, neste “Sangue Azul” ela
é apenas mencionada, dita, mas não mostrada, deixando para quem vê o longa,
apenas imaginar a tragédia que estará para acontecer.
A trilha sonora presente no drama
tem uma interação muito gostosa, um instrumental delicado, que as vezes chega a
ser profundo, as vezes suave. A fotografia sempre privilegia as paisagens
naturais, com destaque para a praia, um lugar intocável, um lugar em que a
modernidades das cidades grandes não conseguiram penetrar.
O elemento da água
sempre está constante no filme, como elemento de fluidez, de transformação, de
confronto e de constância. As águas correm e por mais que venhamos colocar
obstáculos à sua frente, ela corre e nada pode impedi lá. Esta relação pode ser
colocada na ideia que se estabelece entre estes irmãos. Por mais que os
familiares tentaram separá-los, por mais que a distância entre eles tenham sido
grandes e tempos tenham passado, ainda sim, nada disso foi de fato forte para
impedir que o pior acontecesse e este mal fosse evitado.
Divido em capítulos, cada capítulo
demarca a estrutura do filme. Em todo drama há um “q” de existencialismo, um
tom de mistério e de predestinação. Uma certeza paira sobre todo longa, uma
certeza envolta de tragédia.
Assim é este “Sangue azul”, calcado no melhor da
tragédia que as histórias podem conter. No elenco grandes nomes do cinema
nacional como Daniel de Oliveira, Milhem Cortaz, Matheus Nachtergaele.