domingo, 17 de junho de 2012

O Clube do Bang Bang



Baseado na obra “O clube do Bang Bang” que faz um retrato real baseado na história de vida de quatro jornalistas que presenciaram e fotografaram os conflitos finais do Apertheid na África do Sul, longa conta, por meio de uma história simples, a vida desses quatro personagens e como estes vivenciaram essa experiência.

Ao final da década de 90, a pressão sobre a África do Sul para que se colasse um fim em seu regime segregacionista que separava por lei, território de negros e brancos e realizava um governo altamente racista, estava em seu ápice e próximo de seu fim. Para conter as revoltas internas que aumentavam, o governo colocou em rivalidade duas grandes e fortes tribos, promovendo uma verdadeira chacina entre ambos. Com a polícia e governo local promovendo essa guerra sangrenta entre eles, se amenizava uma possível revolta contra o governo e por consequência, esse regime separatista poderia continuar.

Nesse momento, quatro jornalistas fotografaram esse momento e venderam essas imagens há vários veículos de comunicação. Muitas das imagens lembradas até hoje desse sistema, desse governo, veio pelas lentes destes jornalistas. Devido a se colocarem em linha de frente com o perigo, ficaram conhecidos como o “Clube do Bang Bang”, porém apesar dos vários prêmios que muito deles ganharam, o saldo para essa ousadia custou caro, Ken Oosterbroek, morreu em trabalho e Kevin Carter se suicidou, depois das pressões que recebeu pós ganhar um prêmio por uma fotografia tirada em trabalho. É nesse drama que o filme vai focar e trabalhar, tendo como ponto de vista o jovem Greg Marinovich. 



O drama é bem simples, não há ousadia, não há algo que chame a atenção. Ele é simplesmente correto. O diretor deixa por conta da história todo o peso do filme. As cenas chocam, fotografias reais em preto e branco ganham a tela, dando mais veracidade e pontuando o longa. O drama desses personagens enquanto pessoa não é muito focado, o único a ter isso um pouco melhor trabalhado é Marinovich, o protagonista dessa história. Porém, nunca realmente sabemos o que eles sentem, eles estão lá, presenciam tudo, registram tudo, mas o que pensam disso ou que lado defendem, jamais ficamos realmente sabendo.

Um dos temas levantados pelo filme e bem trabalhado no drama é com relação a ética na profissão. Eles enquanto jornalistas, não podem interferir na realidade, mas ela por si só é extremamente dolorosa. A questão que fica constantemente é o que é certo fazer diante do fato: registrar, não registrar, interferir no meio ou não. Kevin, famoso por ser dono de umas das imagens mais chocantes do fotojornalismo, vivenciou esse drama. Sua foto provocou reações, mas ao mesmo tempo, muitos lançaram críticas ferozes contra ele, questionando até que ponto vai o profissionalismo e começa os valores humanos.

Mas não é apenas a questão da ética que prevalece nesse filme, mas também a da dor diante dessa realidade tao crua e dolorosa. O que se fazer frente a esses acontecimentos? Como reagir, ou como se comportar? Eles apenas registram, mas também veem, observam e ficam calados, paralisados e imóveis diante desses acontecimentos. Mas o que se fazer para mudar essa realidade, essa verdade. A forma como a câmera fica disposta, trêmula, nos causa essas mesmas questões, afinal, estamos vendo o que eles viram, então, estamos sentindo os que eles sentiram e estamos paralisados do mesmo modo que eles também. Que lado eles defendem não é nos revelado, mas saber que essas cenas os chocaram e os destabilizaram, isso é percebível.

Bem recebido em alguns festivais, pouco comentado e divulgado no Brasil, é um bom drama que conta uma boa história, tendo um bom elenco para dar vida a esses personagens. Básico sim, mas muito bem feito. Poderia ter sido melhor trabalhado, mas também, não se rendeu ao modo mais fácil, entregando um bom filme. Não é melodramático, segue mais uma cartilha documentário. 

A trilha é suave, a direção sempre segura, questões políticas estão a parte, pois o registro desse filme fica por conta mesmo de como é registrar a morte, a dor e como se manter diante desse fato. É ficar e como ficar diante da dor dos outros. 

 

50/50



Adam (Joseph Gordon-Levitt) leva sua vida a sério. Se alimenta corretamente, possuí hábitos saudáveis, pratica atividade física, é preocupado com todos os riscos que podem acontecer. É um jovem centrado. Trabalha num jornal e tem como melhor amigo, Kyle (Seth Rogem), um cara o oposto dele ao extremo, mas os dois se dão muito bem. Além desse grande e desajustado amigo, ele tem uma namorada, Rachael (Bryce Dallas Howard). Esse casal tem um relacionamento normal, porém parecem mais casados mesmo do que apenas namorados.

Depois de sentir uma dor breve na coluna, ele procura um médico, faz uns exames e descobre o pior, que tem um raro câncer num estágio bem avançado. Qualquer intervenção cirúrgica pode ser fatal, no caso, uma cirurgia é algo arriscado, então o médico numa naturalidade incrível lhe propõe a quimioterapia.

Adam fica em estado de choque, não sabe o que pensar ou sentir, afinal tem um tumor grave com poucas chances de cura. Ele tenta se questionar o porquê, afinal, leva uma vida tão correta: não fuma, não bebe, não faz nada que possa provocar um mal desse. Segundo o médico, suas chances de sobreviver são de 50%. Para tentar levar isso com mais calma, ele vai ter a assistência de uma jovem psicóloga, Katherine (Anne Kendrick), um pouco inexperiente com casos como o dele. Só que se a situação dele já está trágica, ela só piora, pois sua namorada meio que o abandona.

50% é simples, é um comédia dramática que tem como tema um assunto forte e intenso, mas que é guiado e conduzido com muita leveza. Não que o mal dessa doença não seja trabalhada, ela é, mas a forma como isso acontece é feito com muita leveza. Esse longa lembra muito a série The Bic C, protagonizada pela ótima Laura Linney. Assim como na série, aqui nesse drama há a dor de perceber que a vida pode lhe ser arrancada aos poucos e com muito sofrimento, mas também é mostrado a tentativa de se viver, simplesmente viver. 

 

Adam está em crise, não sabe o que sentir ou o que pensar. É como se ele ainda não compreendesse o que está acontecendo com ele. Seu amigo também, tenta passar essa ideia de que está tudo muito bem, tudo muito normal pra ele, tanto que até tenta usar dessa doença para pegar mais garotas facilmente, só que nada está bem e isso se percebe nos olhares. Todos estão temerosos quanto a tudo, a única personagem a demonstrar esse medo é a mãe de Adam.

Ele não se abre, não se entrega a essa dor, tenta permanecer na defensiva, mesmo Katherine tentando lhe explicar que é normal todos ficarem abalados. Mesmo ela sento didática quanto a sentimentos, ela quer que ele entenda que a dor é pra ser sentida, o medo e o desespero também, afinal faz bem chorar. Ao mesmo tempo que tudo na vida desse jovem se abala, surge entre Andam e Katherine uma ligação muito forte e sensível, uma atração entre ambos, guiada pelo medo, euforia, confusão e tentativas frustadas de se tentar entender o que o outro sente. Esse relacionamento demonstra que a vida continua.

Apesar de ter algumas falhas no roteiro, como a construção da personagem da Katherine que está no doutorado com apenas 23 anos, o longa acerta a mão no drama desse jovem, no modo como um possível romance é construído entre Katherine e Adam e no leve tom cômico que há na relação de amizade entres esses dois amigos. A relação da amizade entre esses dois é a melhor. Há uma simplicidade muito grande entre eles, um completa o outro. 

Destaque para a cena em que Adam se solta de verdade diante de tudo, quando está no carro, tentando aprender a dirigir no meio da noite. O grito e o desespero dele diante dessa verdade é incrível. Dor, revolta, injustiça, enfim, a vida é dura e isso essa cena nos consegue transmitir com maestria.

Assim é essa comédia, um bom longa independentemente com um bom elenco e uma boa direção, sensível e terno sem pesar a mão nas lágrimas. 

 


Foi Apenas um Sonho



Leonardo di Caprio e Kate Winslet voltam a trabalhar juntos nesse drama sobre ilusões, sonhos e decepções do aclamado diretor de “Beleza Americana”, Sam Mendes .

April (Kate) e Frank (Leonardo) são casados. Tem uma boa casa, uma linda casa na verdade, tem nos seus vizinhos boas pessoas que sempre que podem passam o tempo e finais de semana juntos. Ele trabalha numa empresa, o emprego não gosta muito, mas paga suas contas, ela fica em casa, com seus afazeres domésticos e cuidando dos filhos. Eles tem um casal de criança que dão muito trabalho e desgaste para ela.

Os dois vivem, basicamente vivem, mas por traz daquela boa aparência, daquela boa vizinhança, do bom emprego e boa casa, esconde um engano e uma vida que não desejavam. Desprezam seus vizinhos, se satisfazem em perceber em como eles estão acima deles, seja no nível cultural ou nas ambições da vida. Eles teem ambição e muitas. Mas aos poucos vão percebendo que eles nada se diferem de todos, pessoas infelizes, incapazes que pararam na vida e não tem nada que lhes possa orgulhar. Essa verdade entra na vida deles como uma verdadeira morte que os fragmenta e os derruba vagarosamente. 

 

Esse é um intenso drama que chega ao clímax somente ao final, e lá, bem lá nos perguntamos: isso realmente está acontecendo? Com uma mescla de boa fotografia, um roteiro afiado, ótimas atuações tanto dos seus protagonistas., quanto do elenco de apoio e uma excelente trilha sonora que se de destaca ao final, o diretor Mendes entrega um ótimo filme.

O começo do longa já nos diz muito do que veremos em seguida, uma peça de teatro, April no palco, o público meio descontente, impacientes, esperando e desejando que aquilo chegue ao fim o mais próximo possível. Após os aplausos falsos, todos elogiam a peça, a história e o elenco. Na volta para casa, depois de um vasto silêncio, sendo quebrados as vezes por comentários nada eficazes, há uma discussão, uma forte briga e um forte embate. 

A partir desse momento, vemos a distância desse casal crescer a cada dia, seja pelas trocas de ofensas, pelos sorrisos falsos entre si ou pelo pouco diálogo verdadeiro entre eles, no fundo eles não se conhecem. Ao mesmo tempo, também vemos a forma como se conheceram, se aproximaram e iniciaram seu relacionamento.

Outros personagens de peso e importância trafegam pela história, como o casal de vizinhos que são seus únicos amigos mais próximos e sempre vistos por April e Frank com desprezo. A senhora Helen Givings (Kathy Bates), sempre sorridente e com sua língua parecendo um veneno, falando e julgando todos pelas costas. Seu filho John Givings (Michael Shannon), visto por todos como um homem com sérios problemas mentais, mas que na verdade possuí alguns pensamentos muito interessantes e que chegam a ser os mesmos de April e Frank. A relação destes é a parte mais instigante do drama, pois vemos como estes se entrosam com esse personagem e como ao final, a verdade é dita por John e como ela cai como um peso mordaz sobre este casal. 

 

Sam Mendes aqui volta a trabalhar o mesmo tema que em “Beleza Americana”, apenas mudando o período da história. Há sonhos, o desejo de mudança, de pensar que com apenas um novo começo em outro país ou cidade, todos os problemas podem se resolver. 

A ideia de que os problemas estão no local, ao nosso derredor, nos outros, enfim em todos, menos em nós mesmos, prevalece nesse drama. A relação deste casal está num profundo declínio, ele a trai de forma natural, ela tem uma noite com vizinho naturalmente também. Os dois voltam para casa e nada de fato aconteceu. Esse jogo de aparências e de meia verdades é muito bem trabalha pelo diretor, mas a presença desse personagem John, dito como louco por alguns, é o ponto da veracidade, ele é único a expressar o que realmente pensa ou sente, ao contrário que os outros não.

O roteiro é afiado e ganha força ao final na troca de acusações de ambos. Amor, traição, desejo, tudo é despejado numa sequência que causa espanto ao espectador. Todas as palavras e sentimentos guardados são vivenciados e ditos com peso e voracidade. A trilha é belamente usada e o elenco, ótimo. 

Com um final belo e envolvente, mergulhado numa excelente trilha sonora que nos causa ansiedade e perplexidade, o diretor nos entrega uma drama consistente, com boas atuações num roteiro bacana e eficaz. 

 

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Mary e Max: uma amizade diferente


 
Essa é uma animação muito simples, porém muito cativante. Uma Nova York triste e melancólica, uma Austrália quente e vibrante e dois protagonistas que apesar de estarem tão distantes entre si, criarão e desenvolverão uma amizade tão grande e forte que irá ultrapassar as décadas.

Mary (Tony Collette) é uma garotinha inquieta, cheia de dúvidas e totalmente solitária. Seu pai trabalha constantemente e sua mãe vive bêbada com seus vinhos. Ela num dia, enquanto sua mãe rouba algumas coisinhas, resolveu abrir a lista telefônica dos Estados Unidos, e olhando para os nomes estranhos dos americanos, escolheu um dentre vários e escreveu uma carta para ele. Em sua opinião pensava que ele jamais ira responder, porém ele responde e assim nasce essa amizade. Improvável, mas é esse o termo que irá prevalecer durante todo o filme.

Enquanto isso nos Estados Unidos, conhecemos Max (Philip Seymour Hoffman), um sujeito grande, gordo e meio desajustado. Adora comer cachorro quente com chocolate. Mora sozinho e tem a companhia de uma senhora meio cega. Frequenta um psiquiatra que dá dicas nada interessantes à ele. Não tem amigos e não consegue chorar ou sorrir, no fundo não entende as pessoas, as considera muito complexa e esquisitas.

Num certo dia, recebe uma carta de uma garota da Austrália. Na carta dizia inúmeras coisas, ele ficou nervoso e entrou em pânico e fez o que sempre faz quando isso acontece, foi comer cachorro quente com chocolate. Após pensar e repensar, resolve responder a carta. Se apresenta, pede desculpa pela demora e espera ter notícias dela novamente. Assim como ela, ele também não tem amigos. A partir desse fato, os dois passam a se comunicar, via carta, por anos. O tempo passa, fatos acontecem, inúmeros fatos e muitas coisas mudam para sempre na vida desses dois personagens. Ele continua sua vida por aqui e ela aos poucos vai vivendo por lá, com suas dores, dificuldades e barreiras impostas pela vida. 

 

É com delicadeza mergulhado num tom melancólico e triste, repleto de cores escuras, acinzentadas e personagens nada belos que o diretor constrói essa narrativa sobre a amizade. Uma amizade verdadeira que nos faz ver os pequenos valores da vida e seus sentidos. Há em todo filme ótimas lições sobre a vida, questionamentos, existencialismo, tudo beirando a simplicidade, a inocência. O que começa como perguntas bobas como, “de ondem vem as crianças” chega a questões sobre como encarar traumas passados, sobre o que é a vida, ou sobre como e porquê as pessoas se comportam de forma tão arrogante, egocêntrica e sempre mentindo e escondendo seus sentimentos.

O roteiro é ótimo nesse sentido, pois ele trabalha com a simplicidade das palavras. Não há grandes metáforas, mas simples perguntas que guardam respostas muitas vezes inalcançáveis. Porque sofremos, quando não queremos sofrer, porque morremos, se na verdade o queremos é viver, o que é de importante na vida? Realizar toda aquela lista que temos quando criança ou já adultos é de fato importante? Se não é, o que é então? Porque a solidão nos persegue e nos faz sofrer?

As pessoas são complicadas, essa é afirmação de Max, ele tem Aspenger, uma doença que dificulta a socialização dele com outros, que o impede de entender o que as pessoas realmente sentem ao expressar uma palavra ou uma feição. Ele é internado, eletrocutado, estudado, visto e revisto, ele é diferente, mas quem não é? A normalidade aqui é tratada de forma bela, pois ele tem as respostas paras as suas perguntas, o sossego para os seus questionamentos. Se no começo do filme, ele tenta ser quem nem todos, com metas a cumprir, ao final, ele compreende o que tem de valor e é nisso que reside seu contentamento. Apesar da animação ser tao melancólica, ela nos causa um certo ar de conforto, prazer, uma certa alegria, é como se o desenho nos fizesse rever e rever tudo a nossa volta e a ver nessas cores frias e se vida, um certo calor pulsando firme e forte.

A trilha sonora desse longa é outro ponto belo, ela é simplesmente soberba, envolvente e encantadora. Em cada melodia e cada toque há dor, alegria, tristeza, alvoroço, contentamento, aceitação. A direção e roteiro são ótimos, um belo e fabuloso trabalho. Enfim, um filme, um desenho que dá gosto de ver e rever inúmeras vezes, tanto pela sua simplicidade, quanto pela sua história ou pelos seus personagens.