quinta-feira, 30 de maio de 2013

Canções de Amor




"Canções de Amor" é sobre o amor, sobre a dor, sobre a perda e um possíuvel começo. 

Este drama francês é repleto de canções que retratam o amor, simplesmente o amor. Um musical simples, terno e tocante que nos conquista pela sua simplicidade. Uma melodia percorre todo o drama, uma amargura profunda está sobre todos os personagens, porém, o ato de cantar os deixam mais leves. Esse filme é sobre o amor, não sobre ideias, movimentos, mas sobre esse sentimento tão puro e inocente.

Ismael (Louis Garrel) possui um relacionamento de anos com Julie (Ludivine Sagnier). Ele a ama e constantemente diz isso a ela. Porém Julie não tem a mesma certeza desse sentimento. Eles tem uma relação a três e o terceiro elemento desse namoro é Alice (Clotilde Hesme), amiga de Ismael. Esse triãngulo passou a existir há poucas semanas, mas já consome uma boa preocupação de Ismael, já que nesse triângulo, tudo transparece que é ele quem ficará de fora, apesar de Alice se sentir como uma ponte entre os dois e os manter unidos ainda. 

O filme é divido em três partes: Separação, Ausência e o Regresso. Cada parte estará relacionada intimamente a Ismael. Mostrará suas ações e atitudes, sejam elas movidas pelo medo, pela dor ou pelo amor.

Em "Canções de Amor", Christophe Honoré aposta no musical, mas não é aquele em os atores soltam suas vozes, numa desmontração que realmente sabem cantar, mas seu elenco apenas susurra palavras rimadas, envolvidas em belas melodias. Essas canções representam seus sentimentos, medos e receios. Elas completam uma frase, uma palavra não dita e são usadas como diálogos. Talvez aí que esteja a beleza desse filme, canções simples, perfomaces mais simples ainda, porém com o mais puro sentimento, em que todos se entregam totalmente às suas canções.




Na primeira parte vemos esse triângulo amoroso, mas já podemos perceber que eles já estão desgastados. Um casal em crise que tem como eixo de sustentação um terceiro elemento que é Alice. Ela trabalha com Ismael, divide momentos com Alice, mas sabe qual é o seu lugar nessa relação, sendo que se coloca como tal.

Com uma perda ainda no começo, os caminhos de Alice e Ismael tomam rumos diferentes, outros elementos ganham a vida e a dor se instala. Nesse momento, a tristeza é trabalhada com muita ternura, mas de forma delicada e as músicas aqui nesse momento entram para amenizar essa dor e mostrar o quanto todos estão perdidos. O interessante nesse drama é que vemos a dor de forma tão suave que nos esquecemos que a morte está ali tão presente e tão forte. Ismael sente a ausência de Julie, e não sabe como se comportar, mas precisa tomar um atitude. O que ele precisa na verdade é vivenciar essa dor.

Mas ao final, novos ares reaparecem, a chuva cessa um pouco e essa Paris mostra como o amor ainda é forte e intenso, mas é um "amor" não preso a rótulos, mas apenas a um puro e verdadeiro sentimento. É nesse momento que entra o personagem de Brendom. Essa relação é construída de forma natural e é um dos melhores momentos do longa, conjuntamente da presença de Alice que é encatadora e dá brilho em todas as cenas em que aparece.

"Canções de Amor" quer mostrar que seus personagens são reais. Apesar de toda cantoria, o que eles querem expressar por meio dessas melodias são seus sentimentos, sejam eles de prazer, duvidas ou medos. Em muitos momentos, nos faltam palavras e sempre alguma música se coloca como verdadeira declaração. E estas são feitas nesse filme justamente para que estes personagens declarem o que sentem. Essas músicas nascem de momentos mais intímos ou simples, seja numa cozinha, num parque ou mesmo nas ruas desta Paris.

Por ser um musical, sua trilha sonora é excelente. Belas letras envolvidas numa melodia triste e amarga, mas que em alguns momentos ganha tons mais intensos e alegres. É simplesmente prazeroso ouvi-las. Em todo o filme, um clima meio pesado prevalece no longa, mas seu desfecho tem uma pitada de alegria e claro, uma declaração de amor: "Me ame menos, mas me ama um pouco mais". 

O elenco é otimo, a direção de Honoré consegue trazer humanidade aos seus personagens, revelando como estes são frágeis, sentimentais e acima de tudo, humanos. Louis Garrel e Clotilde Hesme são os que se destacam. As cenas envolvendos estes dois são cheia de carisma, graciosidade e ternura.

"Cancões de Amor" é repleto de sentimentos, verdadeiros e profundos, repletos de canções de dor ao amor. Um filme que se vê e constantemente deseja revê-lo. Um drama que aborda o amor e um recomeço, por meio de melodias que retratam a vida em seus mais diversos momentos. 


 

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Deixe a luz acesa, ...


 Em “Deixe a luz acesa”, drama expõe homossexualismo e dependência em drogas, mas também o vazio de uma geração, de uma sociedade. Sentimentos de medo e de solidão, a não realização, a busca por algo que nos complete e que nos faça sentir mais seguro com relação a tudo o que nos cerca estão nesse drama, estão sobre esses personagens. 

Uma bela canção começa, quadros expressionistas de nu masculino são jogados à tela. Imagem e música se casam numa junção perfeita. Nos sentimos bem, o som toca, a melodia é agradável. Após isso vemos Erick no telefone num bate papo buscando sexo fácil. Estamos em 1997, nesse primeiro encontro, conhece Paul (Zachary Booth) que após o sexo afirma possuir uma namorada.

Os dias decorrem e Erik (Thure Lindhardt) ainda está nessa busca por satisfazer seus desejos.  Paul retorna e nasce entre eles um sentimento mútuo. Cada um possui seus segredos, enquanto Erick tem queda pela busca do prazer, Paul (Zachary Booth) tem as drogas em sua vida.

A cada ano, o relacionamento deles fica mais forte, assim como os defeitos de ambos se mostram claros. Enquanto Erick está profundamente mergulhado na produção de um documentário, Paul está se lançando cada vez mais nas drogas. E é assim que acompanhamos esse relacionamento do momento em que surgi em 1997 até 2008. 


“Deixe a luz acesa” trabalha com humanidade e sinceridade a busca de todos por algo que os faça sentir completos. Seus personagens estão em busca, numa procura contínua, seja por um filho, a realização de um documentário, ou a necessidade de matar o desejo de um vício.

Mas nem tudo dá certo nesse filme, assim como nem tudo dá certo na vida. Nessa trama, o homossexualismo é abordado com muita naturalidade, isso é bom, ok, mas o preconceito e as dificuldades imposta a estes que aceitam vivenciar essa vida não. Paul e Erick vivem, moram juntos, tem uma relação juntos, mas a discriminação e as reprovações não aparecem, é como se estes vivessem numa redoma de vidro, numa bolha onde tudo é perfeito. Mas em meio a essa perfeição, a imperfeição ainda está presente, materializada pelo vazio que todos temos em nossas vidas.

Quando estes dois jovens começam a se relacionar, outros problemas aparecem e nesse ponto, “Deixe a luz acesa” acerta o tom e trabalha com o medo da traição, das drogas e da doença.  Um medo que não se compreende e que não se entende ou explica, mas que se sente. Guardamos para nós.

Nesse momento, o longa acerta o tom. Erick sofre, sofre muito ao longo desse relacionamento. Mas quando tudo indica que bons ares virão sobre a vida deles, percebe que nada é como pensou ser e aquele sentimento que o movia não o move mais, então, o que fazer diante disso? Quando o fim chega, um novo começo pode dar as cartas. Quando um problema nos surge e é resolvido, outro aparece. Nunca estamos bem com nós mesmos. 


 

Li em certa crítica que em alguns momentos o homossexualismo é mostrado ligado a promiscuidade, principalmente em seu começo. A meu ver, isso não se revela dessa forma. Nesse drama há jovens em busca de algo, ora e o que é o sexo se não uma satisfação momentânea que apaga o medo da vida, para em seguida surgir ainda mais implacável.

Banhado por boas canções, retratando a intimidade de seus personagens, se mantendo distante e perto, “Deixe ...” mostra apenas personagens, sejam estes homossexuais ou não. Sujeitos que tentam, mesmo diante de tudo na vida. Ao final, problemas que cercam a todos, os cercam também. O fim vem, envolto de um sentimento e uma sensação que tudo valeu a pena, ou que ainda valerá.

O elenco é razoável, a direção acerta, a trilha é muito boa e as intenções sobre esse longa são ótimas. É um prazer saber que filmes direcionados a um público fechado ganham mais espaço juntos a outras produções. Isso nos mostra que o diferente torna-se próximo e o que era “diferente”, se revele nem tanto assim.

O tempo muda, valores se manteem, novos são construídos e essa busca por compreender o que nos move contínua. 



Um rapaz do Sul


 

Amor, desejo e violência. Uma dose de racismo, misturada a um forte preconceito, sob um sol escaldante. Esse é o cenário que irá prevalecer sobre esse “Um rapaz do sul”. 

Ward (Matthew McConaughey) é um jornalista que retorna à sua cidade natal com o objetivo de investigar as acusações de assassinato que estão sobre o preso Wetter (John Cusack). Ele está condenado e prestes a receber a pena de morte por ter matado um policial. Mas Ward vê nessa prisão graves falhas na forma como todo o caso foi guiado. Com essa reportagem ele pode obter o prestígio que tanto deseja.

Junto de Ward está Yardley (David Oyelowd), um jornalista negro que está obtendo fama em sua carreira. Seu intuito é ter o respeito que merece na profissão. Sendo negro, sente o racismo de perto, seja na carreira ou na vida. Chegando ao sul do país, vai se deparar com um estado onde o negro não tem lugar e terá que se impor com autoridade para não ser humilhado pela sua cor.

Charlotte (Nicole Kidman) é uma mulher perto dos seus quarenta anos que diz estar apaixonada por Wetter. Os dois trocam inúmeras cartas de amor, sexo e desejos. Ela tem total certeza que ele é inocente e vai ajudar Ward nessa empreitada. Jack (Zac Efron) é irmão de Ward. Expulso da faculdade após um ato de rebeldia voltou a morar com o pai. Trabalha pra ele entregando os jornais, muito ligado ao irmão, topou ajudá-lo na busca de descobrir a verdade sobre esse crime. Esse grupo de personagens irá trafegar por uma história densa, marcada por segredos, brutalidade e violência. 


“Um rapaz do Sul” tem uma Nicole Kidman extremamente sensual, um McConaughey numa atuação vigorante e uma direção que não peca e abusa das cenas fortes onde a crueza da vida dá o seu destaque. 

Com direção de Lee Daniels, esse drama abusa das imagens bizarras. Um filme cru, forte e viril. Um sul quente e injusto onde uma minoria está renegada a não ter uma voz. Em meio a direitos civis que estão começando a serem proclamados, nessa região, as mulheres estão subordinadas a homens violentos, negros a terem que se calar diante da opressão e homossexuais estão sujeitos a serem humilhados e mortos com a mais pura brutalidade.

Com uma fotografia estourada que abusa dos cenários quentes, “Um rapaz do sul” invoca a todo o momento essa região dos Estados Unidos marcado por um forte calor, pobreza, preconceito, violência e racismo. Em meio a pântanos, mato, animais selvagens e rios, enfim, está toda pureza e selvageria da vida humana. Essa imagem está representada, seja por meio das paisagens ou pela postura de seus personagens. Homens e mulheres perdidos na vida, sem expectativas e que buscam em meio a essa brutalidade que é a vida uma forma de se manterem vivos.

Não há como não ver esse longa e se impactar com as cenas. A violência está diante de nossos olhos e estamos fracos diante dela, nada podendo fazer. Ao final, o que resta a estes personagens são lágrimas de dor e revolta em meio a seguinte pergunta: como tudo isso pôde acontecer? 


O melhor desse filme está em seu elenco, onde Nicole Kidman se sobressai como Charlotte, uma mulher intensa e forte, sensual e frágil. Se num começo do longa ela nos transmiti ser extremamente sensual, capaz de levar homens a loucura, com o passar dos minutos, ela se revela doce, delicada e frágil que só deseja ter alguém ao seu lado.

A relação que se cria entre Chalortte e Jack é o que há de melhor. Uma amizade marcada por uma inocência, onde ele se vê perdidamente apaixonado por ela e Chalortte, tendo consciência desse amor, não compreende como ele pode estar a amando, uma mulher que não pode oferecer nada a ele. 

Alem dessa atuação, há um excelente roteiro que abusa das cenas, cenas essas onde tem até uma Nicole Kidman provocando e sensualizando, fazendo com que um John Cusack chegue ao seu orgasmo, sem ao menos tocá-lo. Essa foi uma das cenas mais emblemáticas do longa que rendeu ótimas criticas para a atriz.

“Um rapaz do sul” caminha por um lado intensamente dramático e que mostra uma face violenta do homem. Um lado capaz de matar e sentir prazer em cometer tal ato. Um lado sujo, vulgar, escuro, obscuro e que não queremos aceitar. Um lado que fere, marca e sangra.   




quarta-feira, 15 de maio de 2013

Beleza Adormecida

 
De onde vem tanta passividade?

Lucy (Emily Browning)é uma garota esforçada. Estudante, faz e aceita todo o tipo de trabalho para conseguir sobreviver. Trabalha num escritório, num café, como acompanhante e garota de programa por fora. Enfim, ela se esforça. 

Fria, sempre calada, nada a perturba facilmente. Possui uma passividade com relação à vida impressionante que chega a assustar. Em um dos inúmeros trabalhos que aceita, ela encarna uma mulher praticamente morta. O serviço é o seguinte, por uma quantidade de horas ela ficará sob efeitos de uma droga que a manterá em estado de sono profundo. Nada a acorda. Ao que pagar para tê-la, poderá fazer o que deseja, exceto penetração. 

“Beleza Adormecida” é um drama extremamente seco. Sem uma trilha sonora presente no filme, o longa impacta, seja pela história, ou pela sua protagonista, ou mesmo pela total imersão e fora da realidade a qual todos os personagens deste filme estão. 


O longa faz uma referência ao conto “Bela Adormecida”. Mas nessa trama não há pureza ou um príncipe encantado. Lucy é posta nas cenas mais humilhantes possíveis. Essa sua paralisia com relação a tudo mostra sua postura diante da vida. 

Poucas são as cenas que demonstram sentimentos por parte dela. As únicas envolvem um personagem que não é muito revelado sobre seu passado ou qual é a ligação deste com ela. Esse homem é o único responsável por fazermos perceber que ainda há um pouco de humanidade nessa personagem. Ou seja, que ela é capaz de amar, sofrer ou chorar. No mais, vemos ela andando de um lado para o outro, de um serviço ao outro, trabalhando, se prostituindo e tudo isso com uma naturalidade aterrorizante. 

Talvez esse seja o pecado desse drama. Até que ponto podemos nos manter tão distantes e frios diante das circunstâncias da vida ou dos problemas que nos cercam? Lucy é apática, quase invulnerável. Jamais conseguimos compreender seus sentimentos ou que ela esteja pensando. O único momento de calor humano, de dor, raiva, medo e desespero, normal a qualquer pessoa é ao final da trama, mas aí, já somos pegos pelos créditos do final do filme. 


O longa recebeu duras e severas críticas devido a forma como foi desenvolvido. A meu ver, toda sensibilidade, empatia e medo com relação a essa protagonista é o espectador quem sente. Vemos o ponto de vista de Lucy, vemos seu mundo, sua vida, mas somos nós que sentimos suas dores e julgamos seus atos. Nós somos seu furor, seu calor, enfim, sua humanidade.  

Emily Browning, tão bela e tão fria, está extremamente delicada e profunda. Ela tem um semblante doce, mas ao mesmo tempo distante. Ela de certa forma, quebra com o estereótipo de uma jovem estudante capaz de tudo para se manter numa sociedade cada vez mais obcecada por possuir o que é impossível. Ela não se importa, ela não se choca, nada a toca. 

Com um olhar terno e delicado, ela nos encanta e não presa a moralismo, fica nua, é direta e objetiva, transa com quem geralmente não tem ligação, porque assim deseja, porque assim quer.  

“Beleza Adormecida” nos mostra uma insensibilidade intensa, sensação essa que causa em que vê ao drama, toda uma carga de revolta e inquietação. Provocante e seco. Diferente e distante. 


quarta-feira, 8 de maio de 2013

Medianeras

 

Prédios, apartamentos, estruturas. Uma arquitetura marcada pelo moderno, rústico, clássico e simples. Essa é a estrutura de Bueno Aires. Uma cidade em que o antigo e o moderno ganham vida. Uma cidade comum, como todas as outras, com seus moradores caminhando de um lado a outro, ouvindo música e distraídos, sorrindo sozinhos, conversando sozinhos, dialogando sozinhos. No caso, sozinhos não, estão todos conectados e interligados a outros. Mas ainda assim, estão sozinhos em meio a uma multidão de pessoas. A cidade ganha vida e se transforma num personagem, ela em síntese representa e materializa seus personagens nesse drama intitulado “Medianeras”.

Martin (Javier Drolas) é um rapaz sossegado e tranqüilo. Sofrendo ainda de uma fobia, sai com pouca freqüência de sua casa. Pela internet faz todo tipo de tarefa, realiza compras, paga suas contas, trabalha na construção e manutenção de sites e tenta encontrar uma companhia legal.

Desde que seu namoro terminou está só. Seu cão é o único que o ajuda a não se sentir tão só assim em alguns momentos do seu dia. Sua rotina se consiste em acordar tarde, tomar café e ficar o dia todo em frente ao computador, na internet, navegando e navegando.

Acha tudo monótono, sua expressão com relação a toda sua vida também é a mesma, um olhar apático, frio, sem graça ou algo do gênero. A impressão que se tem dele é que ele vive, apenas vive, sem mais expectativas, sem mais algo que o motive. Suicídio não está nos seus planos, fora isso, tudo o acomete: depressão, medo, solidão, sedentarismo e tantas outras coisas a mais. 
 
Mariana (Pilar López de Ayla) é arquiteta, mas ainda não vivenciou a profissão. Por enquanto, trabalha na montagem de vitrines. Não é algo que ame, mas que a faz se sentir bem. Ela é solteira e possui as mesmas qualidades e defeitos que Martins.

Seu namoro terminou há tempos, no momento em que sentiu que seu namorado era um completo desconhecido aos olhos dela. Ela acorda, trabalha, vai para casa, ouve música e no mais, fica reparando a paisagem e percebendo como a cidade muda, como suas ocupações não planejadas podem ser usadas como metáforas para sua vida ou de tantos outros que acharem que possa parecer. Enfim, os dois praticamente nasceram um para o outro, mas como irão perceber esse detalhe, sendo que nunca se falaram ou trocaram olhares? 



 “Medianeras” é algo que não está nem à frente e nem as costas, que não vemos com clareza e que por conta disso, com o tempo, se revela algo descuidado. Essa região, esse pedaço de nós, revela todo o nosso ser, nossos medos e imperfeições. Faz parte de nós e tentamos sempre a todo custo esconder isso de todos. Mas ao fim, ele se mostra e nos mostra. Assim é esse filme, é esse drama. Ele releva estes dois personagens, mostrando suas inquietações, tentativas, erros e ações. 

Esse filme argentino trabalha com o tema da solidão, justamente numa era em que estamos tão interligados e isso se dá de forma muito interessante. A todo o momento, a internet está presente, ela como a cidade, é um personagem mais do que importante. Ela está presente e se faz presente. Ela nos trouxe a fácil comunicação, mas o que podemos constatar é que em meio a tanta interatividade, tantos “chats”, tantas pessoas navegando, se conhecendo e conversando na internet, ela nos mostrou e nos revelou o quanto estamos sozinhos e solitários e o quanto a “falta” nos persegue e nos fragiliza.

Tanto Martin quanto Mariana fazem parte dessa geração conectada que faz tudo pela internet, ao mesmo tempo em que não fazem nada. Relacionamentos frios, superficiais, gélidos e fracos. Ficam trancados em suas casas, presos a uma tela e ali passam horas. Nunca se viram de fato. Eles teem o mesmo gosto, buscam as mesmas coisas, mas apenas não se encontram, tem tudo para dar certo, só resta que um se vidre no outro, apenas isso e mais nada. Mas isso não é fácil e esse encontro demora a acontecer. 



Outro detalhe desse drama é a presença forte da cidade de Buenos Aires, na verdade, a cidade ocupa um papel central nesse drama. Ela e sua ocupação, seus prédios e construções, enfim seus contrastes entre o antigo, o novo, o diferente e o moderno e todas essas formas fazem uma alusão à vida. São prédios tão diferentes que expressam tantos sentimentos e que escondem tantas verdades. A cidade de Bueno Aires, como Martin afirma no longa, cresceu de forma não planejada e hoje para entender como se dá sua estrutura organizacional e compreendê-la é uma tarefa árdua. Assim também é a nossa vida, vivemos e buscamos sem ter a certeza de nada. A certa altura, se olhamos para traz e vermos nossa vida, iremos nos deparar com um emaranhado de escolhas erradas, tomadas pelo momento e que só causaram dor e arrependimentos.   

Esse “Medianeras” é singelo, maduro e com um tom moderno. É banhado de narrações em “off” que faz uma análise da cidade e uma comparação sobre a vida. Seus personagens são reais, marcados pelo passado e pela angústia do presente. São solitários, fechados e reclusos. Eles estão em busca de conversarem, sorrirem e viverem. A trilha obedece a essa tonalidade do longa: instrumental pesado, profundo, doloroso e triste. Na trama vemos um “inverno curto”, “um outono longo”, e uma “enfim, primavera”, mas o verão, aquela estação quente não. Talvez essa estação fica para o que acontece após os créditos finais e o vídeo deles postado no youtube é uma pequena mostra disso. 

O cinema nacional é de difícil penetração e difusão em todo território brasileiro. Se a própria cinematografia brasileira sofre desse mal, imagina a dos nossos vizinhos. Mas, felizmente, de quando em quando, algumas produções conseguem penetrar nesse tão mercado difícil e nos dá o prazer de conferir dramas tão cativantes e prazerosos como este. Um drama simples em seu contexto, mas muito bem trabalho no seu todo.