quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Incêndio


A dor é dilacerante. O destino as vezes nos mostra caminho desconexos e que ao final, revelam-se muito maior do que nós. Uma história sobre o ódio e o amor na mesma medida e patamar. Um drama em que o passado caminha lado a lado com o presente e de mãos dadas com o futuro, um amanhã incerto, cheio de dúvidas que somente poderão ser esclarecidas quando o passado ter sido aceito e o presente compreendido.

Nawl (Lubna Azabal) morreu há pouco tempo, no testamento destinado aos seus dois filhos, ela deixa um pedido. Eles só poderão enterrar o corpo dela e seguir todos os rituais que a religião pede quando eles realizarem um último desejo dela, uma tarefa que ela não conseguiu cumpri em vida. Voltar ao seu antigo país e entregar uma carta ao irmão mais velho e ao pai deles. A surpresa para os dois filhos com relação a esse pedido fica por conta da notícia de que eles tem um irmão que jamais ouviram falar e que o pai deles ainda pode estar vivo.

Jeanne (Mélissa Désormeaux-Poulin), mais sentimental e tentando compreender o motivo de sua mãe nunca ter comentado da existência sobre o pai e o irmão , resolve realizar esse pedido da mãe. A partir desse momento, vamos conhecendo pouco a pouco a história dessa mulher. Conheceremos sua vida, seu passado e seu drama. Paralelamente a isso, também entenderemos um pouco esse presente, até o motivo de sua morte.

Simom (Maxim Gaudette), o irmão gêmeo de Jeanne segue para esse país bem depois. Mais distante da mãe e nenhum pouco interessado em tentar entender os fantasmas desse passado, ele permanece neutro no começo do filme, mas a pedido da irmã vai ao encontro dela, até que se vê envolvido fortemente nessa história.


O filme é divido em capítulos, sendo que “Incêndio” que dá título ao drama, somente será apresentado ao final da história, como conclusão. A trama sempre será coordenada por fortes pulos no tempo. No começo, há uma certa dificuldade em assemelhar o passado e o presente, já que as duas atrizes são muito parecidas, mas conforme vai se desenvolvendo o drama, vamos percebendo a diferenças entre os dois tempos, e isso se dá devido ao peso do clima que percorre a paisagem, tenso no passado e uma calmaria e sossego sobre o presente.

Incêndio é um filme soberbo, arrebatador e dilacerante como um todo. Uma história forte e intensa, que poderia cair no mais puro sensacionalismo irreal se não fosse o trabalho ótimo do seu diretor. A trilha sonora é competente, misturando instrumental, ruídos, silêncios e toda sorte de som capaz de camuflar sentimentos e direcionar o espectador.

A montagem é eficiente, alterna passado e presente com competência. Todo o fato do passado ganha sentido no presente. Outro ponto interessante é o o clima de mistério criado em cima da personagem Nawl, Ela é uma mulher que tem a dor e peso da vida sobre seus ombros, mas o motivo não sabemos, algo está errado em sua vida, mas o que é, somente ao final saberemos.



Com relação a história do drama, seu grande triunfo se concentra ao final do longa e, na trama criada em torno do mistério envolvendo Nawl e a busca de seus filhos pelo irmão mais novo e o suposto pai que está vivo. A vida é uma verdadeira caixa de surpresas, o perdão e a raiva caminham lado a lado. O mesmo semblante que pode ser de amor, pode também representar ódio e raiva, numa ferida imensurável. “Pode um mais um ser igual a dois”, é com esse diálogo cheio de simbologia que o filme entrega um desfecho arrebatador.

Não é possível ficarmos neutro diante dessa revelação, desse fato, o único pecado do diretor é explicar em imagens, sons e no próprio diálogo essa verdade, se tivesse ficado apenas nessa expressão, esse roteiro seria um dos mais metalingüísticos e simbólicos da história do cinema.

O longa foi merecidamente indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, como representante oficial do Canadá, mas injustamente não levou o prêmio. Em um mundo melhor, filme ganhador deste Oscar, tem suas qualidades e sim, também é um filme excelente, cheio de nuances com um drama competente, porém esse Incêndio consegue ser superior na história, no desenvolver da trama, na mensagem e na forma como conduz o tema violência.



uma forte tensão envolvendo questões religiosas nesse território, sendo que em nenhum momento do longa sabemos de fato qual é esse país, supõem-se que seja Líbano. Islâmicos e cristãos estão num sangrento confronto, mas apesar de ser o primeiro grupo a levantar uma revolta armada, proibindo a livre expressão da religião, são com os cristãos que acontece a cena mais forte e impactante do filme. Um ônibus com islâmicos é cercado por um grupo de pessoas e todos são mortos a sangue frio sem piedade, sendo apenas Nawl a única a sobreviver, seu crucifixo que antes a condenava, naquele momento a salvou. A câmera, nessa cena e durante todo o longa, assume uma posição de observador que fica sempre a distância. Não é o interesse do diretor dar valor ou tentar escolher um lado, mas apenas ver como simples homens podem ser impiedosos e provocar atos irracionais.

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