quarta-feira, 8 de maio de 2013

Medianeras

 

Prédios, apartamentos, estruturas. Uma arquitetura marcada pelo moderno, rústico, clássico e simples. Essa é a estrutura de Bueno Aires. Uma cidade em que o antigo e o moderno ganham vida. Uma cidade comum, como todas as outras, com seus moradores caminhando de um lado a outro, ouvindo música e distraídos, sorrindo sozinhos, conversando sozinhos, dialogando sozinhos. No caso, sozinhos não, estão todos conectados e interligados a outros. Mas ainda assim, estão sozinhos em meio a uma multidão de pessoas. A cidade ganha vida e se transforma num personagem, ela em síntese representa e materializa seus personagens nesse drama intitulado “Medianeras”.

Martin (Javier Drolas) é um rapaz sossegado e tranqüilo. Sofrendo ainda de uma fobia, sai com pouca freqüência de sua casa. Pela internet faz todo tipo de tarefa, realiza compras, paga suas contas, trabalha na construção e manutenção de sites e tenta encontrar uma companhia legal.

Desde que seu namoro terminou está só. Seu cão é o único que o ajuda a não se sentir tão só assim em alguns momentos do seu dia. Sua rotina se consiste em acordar tarde, tomar café e ficar o dia todo em frente ao computador, na internet, navegando e navegando.

Acha tudo monótono, sua expressão com relação a toda sua vida também é a mesma, um olhar apático, frio, sem graça ou algo do gênero. A impressão que se tem dele é que ele vive, apenas vive, sem mais expectativas, sem mais algo que o motive. Suicídio não está nos seus planos, fora isso, tudo o acomete: depressão, medo, solidão, sedentarismo e tantas outras coisas a mais. 
 
Mariana (Pilar López de Ayla) é arquiteta, mas ainda não vivenciou a profissão. Por enquanto, trabalha na montagem de vitrines. Não é algo que ame, mas que a faz se sentir bem. Ela é solteira e possui as mesmas qualidades e defeitos que Martins.

Seu namoro terminou há tempos, no momento em que sentiu que seu namorado era um completo desconhecido aos olhos dela. Ela acorda, trabalha, vai para casa, ouve música e no mais, fica reparando a paisagem e percebendo como a cidade muda, como suas ocupações não planejadas podem ser usadas como metáforas para sua vida ou de tantos outros que acharem que possa parecer. Enfim, os dois praticamente nasceram um para o outro, mas como irão perceber esse detalhe, sendo que nunca se falaram ou trocaram olhares? 



 “Medianeras” é algo que não está nem à frente e nem as costas, que não vemos com clareza e que por conta disso, com o tempo, se revela algo descuidado. Essa região, esse pedaço de nós, revela todo o nosso ser, nossos medos e imperfeições. Faz parte de nós e tentamos sempre a todo custo esconder isso de todos. Mas ao fim, ele se mostra e nos mostra. Assim é esse filme, é esse drama. Ele releva estes dois personagens, mostrando suas inquietações, tentativas, erros e ações. 

Esse filme argentino trabalha com o tema da solidão, justamente numa era em que estamos tão interligados e isso se dá de forma muito interessante. A todo o momento, a internet está presente, ela como a cidade, é um personagem mais do que importante. Ela está presente e se faz presente. Ela nos trouxe a fácil comunicação, mas o que podemos constatar é que em meio a tanta interatividade, tantos “chats”, tantas pessoas navegando, se conhecendo e conversando na internet, ela nos mostrou e nos revelou o quanto estamos sozinhos e solitários e o quanto a “falta” nos persegue e nos fragiliza.

Tanto Martin quanto Mariana fazem parte dessa geração conectada que faz tudo pela internet, ao mesmo tempo em que não fazem nada. Relacionamentos frios, superficiais, gélidos e fracos. Ficam trancados em suas casas, presos a uma tela e ali passam horas. Nunca se viram de fato. Eles teem o mesmo gosto, buscam as mesmas coisas, mas apenas não se encontram, tem tudo para dar certo, só resta que um se vidre no outro, apenas isso e mais nada. Mas isso não é fácil e esse encontro demora a acontecer. 



Outro detalhe desse drama é a presença forte da cidade de Buenos Aires, na verdade, a cidade ocupa um papel central nesse drama. Ela e sua ocupação, seus prédios e construções, enfim seus contrastes entre o antigo, o novo, o diferente e o moderno e todas essas formas fazem uma alusão à vida. São prédios tão diferentes que expressam tantos sentimentos e que escondem tantas verdades. A cidade de Bueno Aires, como Martin afirma no longa, cresceu de forma não planejada e hoje para entender como se dá sua estrutura organizacional e compreendê-la é uma tarefa árdua. Assim também é a nossa vida, vivemos e buscamos sem ter a certeza de nada. A certa altura, se olhamos para traz e vermos nossa vida, iremos nos deparar com um emaranhado de escolhas erradas, tomadas pelo momento e que só causaram dor e arrependimentos.   

Esse “Medianeras” é singelo, maduro e com um tom moderno. É banhado de narrações em “off” que faz uma análise da cidade e uma comparação sobre a vida. Seus personagens são reais, marcados pelo passado e pela angústia do presente. São solitários, fechados e reclusos. Eles estão em busca de conversarem, sorrirem e viverem. A trilha obedece a essa tonalidade do longa: instrumental pesado, profundo, doloroso e triste. Na trama vemos um “inverno curto”, “um outono longo”, e uma “enfim, primavera”, mas o verão, aquela estação quente não. Talvez essa estação fica para o que acontece após os créditos finais e o vídeo deles postado no youtube é uma pequena mostra disso. 

O cinema nacional é de difícil penetração e difusão em todo território brasileiro. Se a própria cinematografia brasileira sofre desse mal, imagina a dos nossos vizinhos. Mas, felizmente, de quando em quando, algumas produções conseguem penetrar nesse tão mercado difícil e nos dá o prazer de conferir dramas tão cativantes e prazerosos como este. Um drama simples em seu contexto, mas muito bem trabalho no seu todo.


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