Com
direção de Richard Linklater, “Boyhood” mergulha profundo na vida de um garoto,
da sua infância a juventude e por este caminho passa pelas suas dores, dúvidas,
silêncios, mudanças e transformações.
O
longa seria convencional, se não possuísse uma característica em particular:
ele foi rodado durante doze anos com os mesmos atores, acompanhando as mudanças
de seus personagens, seus medos, receios e perspectivas.
Por
ser um trabalho ousado e diferente do que se vê no cinema, o longa tem
conquistado ótimas criticas. Entretanto, todos os elogios são bem vindos, pois
o longa possui uma trilha sonora muito gostosa, comovente e nada manipuladora.
Possui uma edição e montagem muito perspicaz que consegue amarrar a trama em
seus mais diversos pulos no tempo. Além disso, o elenco está muito afinado, os
quatro atores principais que fazem parte da trama possuem uma afinidade entre
eles muito forte. A direção de Richard confere graciosidade, profundidade e
beleza ao drama, ao mesmo tempo em que há toda uma simplicidade guiando os
personagens.
O
filme começa com Mason (Ellar Coltrane) ainda pequeno, com seus doze anos. Ele
mora com sua irmã e sua mãe. Os pais são separados, por conta disso, a figura
do pai sempre é ausente na história. Por mais que o pai os visite, se mostre
presente e tente se manter presente, ele não está. Quem sempre está ali, em
cena e com sua presença forte é Olivia (Patricia Arquette), a mãe.
Olivia,
apesar de possuir dois pequenos filhos, ainda tenta reestruturar sua vida,
porém seus filhos sempre estão a frente de tudo e de certa forma, isso se torna
algo difícil, conciliar um possível namoro com sua vida de mãe e provedora do
lar torna-se numa missão impossível.
Devido
a dificuldades ela resolve voltar a morar coma mãe e a estudar, para tentar dar
uma condição de vida melhor a seus filhos. E assim a vida segue e vemos, fase
por fase, momento por momento da vida de Mason e em consequência disso, da vida
de todos os personagens ao seu redor também.
Richard
é um diretor que consegue exprimir muitos sentimentos com fortes silêncios,
entretanto também com diálogos. Seus trabalhos mais conhecidos e bem recebidos
pela crítica “Antes que o dia termine”, “Antes do por do sol” e “Antes da meia
noite” concentram essas qualidades e neste drama essas características também
se fazem presente, porém com mais sutileza.
O
drama é belamente guiado por uma gostosa trilha sonora, um som não pesado, ora
moldado por músicas, ora moldado por um sútil instrumental. A montagem do filme
recebe uma qualidade especial, pois o filme foi gravado durante doze anos,
captando toda a mudança do personagem ao longo da vida. É incrível perceber
como esta criança se tornou num jovem. Essa mudança é tão delicada que somente
notamos essa transformação de um estágio primário a outro mais bem avançado.
O
problema que percorre a vida deste garoto está ligado a problemas comuns, pais
separados, dificuldade em compreender a vida, as mudanças pelo qual ele passa.
Ele é um jovem muito calado, os diálogos em torno dele são poucos. A personagem
de Olivia, apesar de estar dentro do elenco de apoio, é a que possui mais
diálogos neste drama.
Sobre
o elenco, também é interessante notar a força dos atores. Ellar Coltrane é novo
no cinema, porém Patricia Arquette e Ethan Hawke completam o time, dando
dramaticidade e força na atuação. Patricia é a que mais se destaca, com uma
atuação forte, singela, delicada e soberana, ela se mostra presente do começo
ao final.
De
todas estas qualidades, o principal elemento deste drama está ligado a sua
execução. Um trabalho pessoal e ousado do diretor. Todo ano, durante doze anos,
por cerca de algumas semanas, ele e esse grupo de atores se reuniam para rodar
estas cenas. Se desprendiam de seus trabalhos e se uniam a este filme. E mesmo
diante desta dificuldade, o drama consegue manter uma coesão na história do
começo ao fim.
Como
de costume nos trabalhos deste diretor, ao final do longa os diálogos vão se
tornando mais fortes, ríspidos e ousados. Toda verdade ou sofrimento são
lançados sobre os quatro ventos. Toda dor guardada e silenciada é bradada. E
esta dor envolve Olivia e o tempo, o tempo que passou por ela, moldou aos seus
filhos e a colocou numa posição de medo e receio. Neste momento vemos toda
beleza e profundidade do filme. Mason era uma criança, agora ele cresceu e
assim como a mãe dele, vai viver, ter suas vivências, sofrimentos e depois o
que irá lhe restar? A morte, o fim. Tudo é um caminho, um processo e receber a
verdade pode ser dolorosa.
E
é nesta profundidade e graciosidade que o longa caminha e entrega uma bela obra
do cinema, um grande filme moldado pelo tempo e tendo este tempo como elemento
fundamental para este drama. Ao final, a cena que fica é um olhar, um sorriso,
um silêncio, seguida por uma sonoridade que nos remete ao começo do longa. Um
ciclo sem fim.