sábado, 11 de junho de 2011

Em um Mundo melhor

Em um mundo melhor

Susanie Bier entrega um longa que caminha numa linha tênue, entre um filme que se apóia no melodrama e uma história calcada numa direção firme e segura que não deixa espaço para saídas fáceis. Apesar do drama conter algumas lições de morais contidas ao final da película, a forma como ela é direcionada faz com que aceitemos essas ideias e venhamos concordar com a diretora em seus pensamentos, que no caso quer mostrar como a violência, englobada em todas as suas formas ou denominações, não vale a pena.

No longa conhecemos duas realidades distintas e distantes entre si. Num país do continente africano vemos o médico Anton (Mikael Persbrandt) se dedicar a salvar a vidas de um povoado, uma tribo, enfim, um grupo de pessoas que estão à margem de qualquer amparo de um país. Lá ele se depara com a miséria, falta de recursos em que nem a estrutura básica para realizar procedimentos cirúrgicos há de fato.

Além disso há também a fome, falta de perspectiva e a violência que assume sua face mais clara, nas ações de um homem que coordena um grupo armado que vive atemorizando as pessoas daquela tribo, a ponto de escolher mulheres que estão grávidas a dedo para abrir literalmente suas barrigas por pura e simples diversão, matando assim a mãe e o filho que ainda está em gestação no útero da mãe.




Distante dele há uma outra realidade bem diferente. Na Dinamarca, país desenvolvido, com alta qualidade de vida, seu filho, Elias, enfrenta todos os dias no colégio implicância de outros alunos. Por ele ser mais fraco e reservado, acabada sofrendo bulling dos outros adolescentes. Os professores tem conhecimento, mas nada fazem para mudar, acham esse comportamento normal e se invadir o espaço dessas crianças acabarão por prejudicá-las.

Nesse colégio chega um novo aluno,Crisitan, um garoto que perdeu a mãe por câncer a pouco tempo e ainda culpa a todos por isso, inclusive seu pai, que aos olhos dele, permitiu que sua mãe morresse. Ele sente ódio de todos, sente-se injustiçado e ao ver Elias sendo ridicularizado e apanhando de um dos garotos do colégio que é tido como o líder, sem pensar nas consequências ele o protege comprando a briga e batendo nesse garoto. A partir desse momento, os dois se tornam fortes amigos, onde um está sempre a proteger o outro.

O que a diretora quer abordar com esse drama é como a violência está posta em nossa sociedade, seja num ambiente escasso de educação, democracia e justiça ou num país considerado desenvolvido e com alta qualidade de vida.

Por mais que venhamos ser corretos, em algum momento agiremos com irracionalidade e com atitudes agressivas, por sentimentos de raiva, dor ou medo e esse é um dos pontos mais interessantes em que o drama toca, pois é no personagem de Anton que esse fato acontece.

Devido a ele viver numa realidade conturbada como a África, ele tem conhecimento de que a violência, qualquer que seja sua esfera ou o seu motivo, não merece ser praticada, pois não é com um ato violento, de extrema força, que conseguiremos nos impor ou ser respeitados. Porém, em certa altura do longa, ele também é acometido pela raiva e deixa-se ser levado por ela, fazendo com que todos os seus ensinamentos repassados para os seus filhos percam a força.



Mas se a violência o guia quase ao final do filme, com relação ao seu filho e ao amigo dele, ela os direciona em todo momento, chegando a um ápice em os dois perceberão que todo ato, infelizmente, gera uma consequência e que nada mais podemos fazer para reverter esse fato.
Alguns viram nesse filme apenas uma discussão sobre bulling, tema esse muito estudado nos últimos anos e que vem ganhando cada vez mais presença nos debates envolvendo a sociedade, já que somente agora percebe-se que atos como esses de humilhação podem provocar sérios transtornos sejam em crianças, ou em adolescentes.

Mas o longa vai além disso e aborda um assunto mais delicado e complexo que é a violência e como ela está inserida em nossa sociedade. Praticar a justiça pelas próprias mãos, se defender de uma agressão valendo-se das mesmas armas. Tantos são os motivos para se usar da violência que as vezes perdemos o conceito de sua essência, da ideia que rege essa palavra. Um ato violento deixa de ser “violento” só porque ele é guiado por motivos mais nobres? Por esses motivos o drama ganha substância e importância.



Com relação a estruturas técnicas o drama tem ótimos momentos como na fotografia em que obtém ótimos planos revelando uma África miserável, porém bela em toda a sua pobreza. A trilha sonora é contida, o trabalho com os atores é admirável. O personagem de Anton, assim como a do garoto Cristian, são os que mais brilham. Um, pela forma como critica todo ato violento e o segundo pelo modo como materializa e canaliza toda sua raiva diante do mundo em atos violentos.

Após se lançar em terreno americano com o mediano Coisas que perdemos pelo caminho, Susanie Bier entrega um drama consistente, profundo e sensível, as vezes caindo num melodrama, como ocorreu com seu último, mas ainda sim, mantendo a linha e a seriedade que o tema pede. Ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro, se mereceu realmente, já é uma outra questão, mas esse filme tem seus méritos por ter sido indicado.


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