quinta-feira, 21 de julho de 2011

Vivendo o acaso


“A gente se esforça tanto pra prever as coisas, mas uma coisa acontece agora e a gente não sabe onde vai dar”
Com uma trilha sonora envolvente, terna e constante em todo filme e tendo São Paulo com seu caótico trânsito como metáfora sobre a vida, o longa Não por acaso mostra como tentamos controlar nossas vidas e como o destino se coloca forte diante de nós. 
Enéias (Leonardo Medeiros) é um homem quieto, com uma vida presa ao seu trabalho, ou seja, seu trabalho é a sua vida. Seu emprego: guiar o trânsito por sistemas eletrônico. Por esse motivo, conhece todas as ruas, vias e rodovias da cidade. Tenta conduzir sua vida como coordena o seu trabalho. Tudo seguia normal até que um acidente de carro envolvendo sua ex-mulher muda sua visão sobre os fatos que lhe cercam. Ele simplesmente perde toda a estrutura. Mas outro porém acontece novamente em sua vida. Após alguns dias, aparece em sua casa uma garota chamada Bia (Rita Batata). Ela diz ser sua filha que havia descoberto pela mãe, pouco antes dela morrer, a verdade sobre ele.
Pedro (Rodrigo Santoro) é um jovem dono de bar que adora jogar sinuca. Mas o jogo não é simplesmente uma diversão, mas um modo dele levar a vida. Ele fabrica mesas e tenta participar de torneios. Namora uma garota simpática que ele ama. Ela acabou de se mudar para o seu apartamento e passou a alugar seu antigo para Lúcia (Letícia Sabattela). Tudo seguia normal na vida dele até que sua namorada morre no mesmo acidente de trânsito envolvendo a ex-mulher do Enéias. A partir desse momento o filme mostrará como esses dois personagens irão reagir a esse acidente que não estava planejado em suas vidas.




Vivemos planejando todos os passos, todas as decisões ou escolhas. Porém a vida não é tão simples assim. Tanto o trânsito como a mesa de sinuca representam essa nossa ideia de tentar gerenciar o nosso destino. Tudo é calculado e direcionado de forma sistemática, nada pode sair errado, porém, quando algo sai, todos ficamos paralisados, perplexos, sem reação.
Mas do mesmo modo como surgem fatos que nos deprimem, a vida nos coloca escolhas e situações que podem ser o momento de nos levantarmos e seguirmos adiante com a vida. Para Enéias é a descoberta de ter uma filha e a nova sensação de ser pai, para Pedro é a chegada de forma inesperada de Lúcia. Seus personagens estão amargurados e ressentidos, mas ainda tentam viver. É nesse ponto que o longa toca e passa a ser tão comovente.
Há muito mais silêncio do que palavras. Muito mais momentos de dor do que alegria, nada é forçado entre os personagens. As paisagens completam o que eles sentem. Eles não falam dos seus sentimentos. Nada é dito, nada é falado ou comentado, mas podemos perceber pelos seus olhares perdidos, pelos seus diálogos não completados.
O que é mais interessante nesse drama é que as profissões destes dois personagens representam e simbolizam o modo como levam a vida. As imagens das ruas e avenidas materializam a dor e a tentativa de compreensão de tudo o que aconteceu a Enéias. Com Pedro, as imagens das bolas sobre a mesa e a forma como elas são batidas e rebatidas compondo movimentos calculados e precisos, mostram a desorientação dele em não conseguir entender como aquela catástrofe podê acontecer.  




A dor está presente, a sensação de estar desorientado também. Porém, mesmo diante dessa ideia de estarem perdidos, eles tentarão prosseguir com suas vidas. Presos a lembranças do passado, ainda impactados com a situação do presente, tanto um quanto o outro tentarão dar continuidade à suas vidas.
Não por acaso é um filme brasileiro fora dos padrões da estética da fome ou da pobreza que consegue captar a alma, a dor e angústia de seus personagens. Um drama terno e sensível em que o grande de sua história está na condução dos seus personagens. Pessoas comuns em situações comuns a todos nós.
No elenco Leonardo Medeiros e Rodrigo Santoro levam com competência seus personagens, assim como Letícia Sabatella, Cássia Kiss e Rita Batata dão um brilho a mais nessa história.  




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